Assim como a grande maioria dos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, a Alessandra sofria em casa. Já adulta, a bebida foi a saída que ela encontrou para amenizar a dor.

A infância e adolescência dela foi marcada por insinuações do pai. Os piores dias eram os festivos: Natal, Dia dos Pais, Aniversários, quando ela era obrigada a abraçá-lo.

Aos 17 anos, a mãe da Alessandra saiu de casa e ela sabia que não poderia ficar ali com ele. O que eram insinuações poderiam se tornar algo muito pior, e ela precisava se proteger. Foi aí que ela começou a trabalhar e construiu uma casinha para ela no mesmo quintal.

Mesmo morando no mesmo quintal, a segurança da própria casa fez a Ale viver sua vida com mais tranquilidade. Mas isso durou poucos anos porque quando ela estava com 20 anos, aproximadamente, seu pai sofre um infarto e ela é obrigada a cuidar dele. Ela resistiu, mas o julgamento das pessoas a fez ceder. Para quem não sabia da história, era um absurdo "uma filha não cuidar do próprio pai"

Com o passar do tempo, a situação do pai da Ale foi piorando. Ele quebrou a perna, descobriram que ele tinha osteoporose, e ela teria que dar banho nele. Quando chegou nesse ponto, ela decidiu que beber seria uma saída para ficar menos mal nessa situações horrorosas.

O problema é que a latinha de cerveja antes de dar banho no pai foi virando duas, três... a ponto da Alessandra sempre levar para o trabalho duas latas de cerveja na bolsa. A bebida se tornou um vício para amenizar a dor que ela carregava no peito.

Mesmo sofrendo diariamente nos cuidados do pai, ela tentava dar o melhor, mas os julgamentos eram grandes demais. Numa consulta, o médico perguntou porque que ela não cuidava bem do pai e ela desabafou sobre todos os anos de abuso que sofreu.

Eis que o médico entende a situação e sugere para ela buscar ajuda, e ela decide ir atrás. A Ale foi diagnosticada com alcoolismo feminino e encaminhada para a internação. Depois do tratamento na clínica de reabilitação, ela volta com a certeza de que a vida dela iria seguir sem a bebida.

Mas seu pai ainda estava lá e os cuidados continuariam, ainda mais porque ele começou a ter muitos AVCs, um atrás do outro. No dia da morte dele, a Alessandra foi a última pessoa que ele viu. Foi uma longa caminhada até ela se livrar desse fantasma que a seguiu por quase 40 anos. Essa caminhada não seria possível se ela não tivesse decidido buscar ajuda quando precisou e também a falar sobre a sua dor, e as motivações da sua negação em "cuidar direito" do pai.

Hoje a Ale vive mais leve, mas como ela mesma diz o perdão é algo que talvez nunca aconteça. Mas o mais importante nessa história toda não é perdoar ou não, mas a busca por ajuda. Dividir o fardo com outras pessoas próximas faz a caminhada ser menos dolorida.

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